Retalhos

"Posso não concordar com uma só palavra que disseres, mas defendo até a morte o teu direito de dizê-las". Voltaire.

quarta-feira, abril 12, 2006

Recordação "Em Cascata" II - Cárcere

As noites de solidão sob as estrelas
No vazio do teu quarto
A casa encaixotada
O soalho
E as horríveis linhas paralelas até à parede
O nada absoluto
Que te faz vomitar e te tortura
Nessa letargia de junkie sem tempo
Fora do tempo

Tudo por um grama de pó
Não era isto a revolução
Não era esta a liberdade lisérgica que te estava prometida

E as cinzas vermelhas dos teus olhos
Em contrabando de afectos
Sentindo o vácuo
E o medo de não ter a merda do pó
De acordar sem a merda do pó
Os músculos rígidos
O poderoso nó no estômago
Que te faz saltar as tripas
O medo de não poderes fugir de ti
De não conseguires esquecer esse corpo

Tudo por um grama de pó
Não era isto a revolução
Não era esta a liberdade lisérgica que te estava prometida

Esse corpo que já não serve para nada
Retalhado na sua cosmogonia
Que te tortura na sua inactividade
Que te prende agora ao quotidiano metálico da prisão
Morto nos odores da humidade
Dejecto pútrido
Esperma
Em valsas sonhadas no ressonar da noite de cimento que te envolve.


CÁRCERE - Adolfo Luxúria Canibal / Vasco Vaz