Retalhos

"Posso não concordar com uma só palavra que disseres, mas defendo até a morte o teu direito de dizê-las". Voltaire.

quinta-feira, julho 20, 2006

Conversas com o Professor António Rego

Caros leitores do blog e companheiros de Tertúlia,

Coloco à vossa disposição (e com a devida autorização do Professor) a resposta do Professor Rego a uma questão sobre um problema relacionado com uma pergunta do exame de Psicologia. Li a notícia no DN e achei que teria todo o interesse ter a douta opinião do Professor.

Para quem não tem o privilégio de conhecer o Mestre (Quase Professor Doutor) António, ponha bem os olhos nisto e veja o génio do Génio:


Meu Caro Amigo Rui

Curiosamente e de um modo geral, pretendemos agarrar a certeza e fechar a mão com ela (certeza).
Isto é assim e não assado, ouve-se dizer. Contudo, e acontece com tudo na vida de qualquer fabiano, tudo flui. Que é feito da molecula da agua a que vou dar o nome de "A"? Desaparece ou transforma-se? Flui. Vai rio abaixo? Foi ingerida? Evaporou-se? Nada é estático e nem sempre igual, mesmo os calhaus do monte. Só aos olhos dos humanos que têm vida contada por anos (uma centena que seja) parecem imóveis e que não se transformam.
Tudo isto para lhe dizer que não é fácil viver em permanente mudança...é uma questão cultural.
Estamos numa época maravilhosa mas estamos ainda como dizia eu a meus filhos pequenos, "Era uma vez, no tempo em que os animais falavam ..." ou "No tempo em que nós éramos macacos...!"

Sobre o assunto, eis:

Sobre os exames de Psicologia... quer que lhe seja franco? Não os apreciei como psicologia mas como um conjunto de coisas, perguntas, que qualquer bom cábula, com o senso comum respondia.
Os livros e programas de psicologia do 12º ano parece que pretendem abarcar tudo. Fizeram-me lembrar os RH com aquela mesma linguagem repetida do 1º ao ultimo ano mas com o fundo adquirido na 1ª semana de aulas. Ora, se assim é ou foi para muitos alunos, e não só, (não todos e muito bem) para quê andar um ano inteiro ou anos inteiros a carregar livros e preocupações?
Nos exames de Psicologia e nos critérios de avaliação, se por um lado parece que se anda à caça para "apanhar" o aluno, para avaliar a sua ignorância, por outro lado parece que quem os elaborou tem necessidade de mostrar alguns aspectos da sua "sabença" e eu "desconfio que foram elaborados por gente da filosofia.
Acho que se está a dificultar, sem necessidade nem proveito, a vida aos professores da disciplina e dos alunos. Poderemos aprofundar o tema na tertúlia.

Curioso que tendo eu , em casa, a possibilidade de ver os testes , critérios de correcção, etc, não encontrei ess tal pergunta ou resposta que terá sido isco da polémica.

Sei que as crianças desde muito pequenas mexem na pilinha ou no pipi, olham umas para as outras, para o pai e para a mãe e observam as diferenças. Ficam intrigadas e curiosas mas cedo aprendem que "eu sou rapaz e vou ser homem ou como os rapazes ou homens e tu és menina, rapariga, como as mulheres, porque.. eu tenho e tu não tens etc. Chegados aqui, julgo que é evidente que o género está para cada criança, definido.

Depois vem a idade da escola que serve para acertar melhor aquelas ideia mas entretanto surgem outras, de entre as quais a ideia: Mas para que serve isto? Vê-se o cachorro e a cadelita, o gato e a gata, a mãe e o pai até já terão respondido a perguntas e eis a dolescência, hoje!!, e enquanto demora a capacidade de ejacular, depois de anos e anos em masturbação...
então o eu sou masculino ou feminino já não é nem tem o significado que inicialmente tinha, quando observei a pilinha ou o pipi da mana ou da mãe, porque agora a circunstancia de ser adolescente é diferente da circunstância de ser bebé.

Tudo isto para dizer o quê? Para dizer que a criança sabe se é rapaz ou rapariga mas o adolescente já adiciona nesse conhecimento e seu sentir ou o seu não sentir prazer da função ou seja do exercício da função do género por si atribuido, ou por si aceite.
A presença ou ausência das hormonas sexuais contribuem para a aceitação ou rejeição do género-função, ou seja para a identifacação.
A criança sabe que é rapaz, que é masculino porque lho disseram e ele apenas detecta a diferença, fundamentalmente, através da pilinha, porque tem pilinha. O jovem vai mais além, tem pilinha mas as hormonas femininas podem levá-lo a pensar que "deus" se enganou porque ele sente-se rapariga e com vontade de levar na pandeireta e coisas que tais. Então este/a procura a identidade sexual ao por em causa a identidade de género (inicial)..
Para além disto há muito mais o que só serve para complicar qualquer explicação. Por exemplo, o que levará certos papás de família, com filhinhos e tudo a deixarem as mulheres para os outros e a refugiarem-se nos braços dum "macho"?
Eric Erikson que também foi psicanalista tal como o maldito judeu Si(s)gmund Freud o tinha já feito estudaram o assunto e o Erikson escreveu mesmo dois calhamaços sobre isso.
À volta do temo misturam-se modas, valores, morais e até murais que tais, por exemplo manifestações, conferências, direitos humanos, liberdades e garantias de liberdades, direitos adquiridos e a adquirir, eu sei lá...
Como era tudo isto na Roma antiga? E na Grécia?
Em resumo: A criança sabe se é rapaz ou rapariga e em conformidade procura identificar-se com esse ser rapaz ou ser rapariga socialmente - género.
O adolescente confronta o seu ser rapaz com a líbido prazer que colhe ou não com esse género e, quando nisso há discrepância... admitamos que siga o seu sentir - identificação sexual.

Rui, um abraço e se puser isto no blog...ok.
Rego



-----Mensagem original-----
De: Rui Viegas
Enviada: terça-feira, 18 de Julho de 2006 10:46
Para: António Rêgo (E-mail)
Cc: João Mourão (E-mail); Gonçalo Reis (E-mail); Luis (Cem Soldos) (E-mail); Pedro Pires César (Cem Soldos) (E-mail); Rui Mourão (Cem Soldos) (E-mail)
Assunto: Exame de Psicologia


Caríssimo professor, gostava de saber a sua opinião sobre a notícia do DN que lhe envio abaixo. Penso que era interessante colocar a sua resposta no blog:

Pergunta duvidosa põe em causa exames de Psicologia

Uma alegada incorrecção numa pergunta dos exames nacionais de Psicologia, cujas correcções devem chegar hoje ao Gabinete de Avaliação Educacional (GAVE) do Ministério da Educação, pode pôr em causa a justiça da nota atribuída à generalidade dos 44 363 inscritos nesta prova. A situação foi denunciada, logo no dia em que os exames se realizaram (5 de Julho) por Anabela Rocha, uma professora do Barreiro. Mas o GAVE garante que até agora não teve conhecimento de qualquer "erro" nas provas.

A dúvida prende-se com uma das perguntas de escolha múltipla (onde se opta entre várias possibilidades de resposta) do Grupo I da prova. A determinada altura é pedido aos alunos que analisem "várias formas de procura de identidade" e depois selecionem "a alternativa que as identifica". Num dos pontos refere-se que "Uma das preocupações do adolescente é encontrar uma identidade sexual". E a resposta correcta, segundo os critérios de avaliação publicados pelo ministério, é que isto corresponde a uma "busca do género".

Para o comum dos mortais, a definição gramatical de "género" diz respeito à distinção entre o sexo masculino e o feminino. Mas segundo Erik Erikson, um psicólogo alemão nascido em 1902, a "busca do género" é o que um adolescente está a fazer quando procura encontrar a sua "identidade sexual". Por isso, segundo os psicólogos contactados pelo DN, não há erro na questão "A pergunta integra-se na teoria do Desenvolvimento Psicossocial de Erikson, que está no programa do 12.º ano", considerou Ana Baio, da Comissão do Ensino e da educação do Sindicato Nacional dos Psicólogos.

Mas este argumento não convence Anabela Rocha "Os professores que fazem os exames têm a noção de que essa teoria de Erikson não é dada com a profundidade que a pergunta implica. E não há nenhum manual do 12.º que faça essa relação entre identidade sexual e género", diz. Além disso, acrescenta, "nada na pergunta aponta para Erikson", enquanto "tudo o que os alunos aprendem ao longo do ano sobre desenvolvimento psicossocial os conduz à noção actual de que a identidade sexual se relaciona com a orientação sexual e não com o género".

Na passada sexta-feira, o DN confrontou a directora do GAVE com a polémica questão do exame, mas esta recusou-se a comentá-la, considerando não ser essa a sua "função". Glória Ramalho garantiu, contudo, não ter recebido informação de "qualquer erro" na prova, sublinhando que estará "muito atenta" à situação.

Três valores em 200. O grupo 1 do exame era constituído por vinte itens de escolha múltipla, cabendo a cada um deles o valor de três pontos em 200. Mas para Anabela Rocha, que esteve de serviço como professora coadjuvante (vigilante) nos exames, os três valores não traduzem o prejuízo real para os estudantes "Quase todos os alunos deixaram esta pergunta para o fim", contou. "Ficaram baralhados, inseguros e perderam tempo. Imagine um aluno de 20, que se vê confrontado com uma pergunta para a qual sente que não há resposta correcta. "Vai ficar inseguro sobre o que estudou e isso prejudica o seu desempenho no geral".

Quando o género é opção
A questão polémica colocou os alunos perante o seguinte desafio "Analise as seguintes formas de procura de identidade. Seleccione, depois, a alternativa que as identifica correctamente". Eram depois dados três exemplos: "1. É um período em que o jovem se questiona sobre a natureza das suas potencialidades; 2. Uma das preocupações do adolescente é encontrar uma identidade sexual; 3. O jovem procura um horizonte de trabalho que lhe seja significativo". A resposta "correcta" associava o ponto 1 à "realização pessoal", o 2 à "Busca do Género" e o 3 à "carreira ou profissão".

Grande Abraço,
Rui